Advogados e Inteligência Artificial: Confronto ou Aliança Estratégica?


A Inteligência Artificial (IA) está avançando sobre diversas áreas, e o Direito não ficou de fora. Ferramentas inteligentes já operam em escritórios, tribunais e departamentos jurídicos, tornando-se parte do cenário. Diante disso, a pergunta que não quer calar é direta: a IA vai tomar o lugar dos advogados?

Este artigo analisa, objetivamente, como a IA opera, quais são seus limites práticos no campo jurídico e por que o fator humano continua sendo decisivo na advocacia.

Como a Inteligência Artificial Opera?

É fundamental entender o básico: a IA não possui consciência, emoções, senso de justiça ou código moral. Seu funcionamento é puramente lógico e matemático, baseado em algoritmos de machine learning. Ela processa volumes massivos de dados para identificar padrões estatísticos.

Por exemplo: alimente uma IA com milhares de julgados e ela pode identificar tendências e até estimar probabilidades de resultados em casos similares. Isso é a jurimetria – tecnologia já em uso, como no projeto Victor do STF[[1]], que auxilia na triagem de processos complexos. Além disso, vemos ferramentas de IA sendo empregadas em e-discovery para analisar grandes volumes de documentos em litígios ou na revisão automatizada de contratos para identificar cláusulas padrão e potenciais riscos.

Contudo, o ponto central é este: embora de forma cada vez mais sofisticada e com novas capacidades emergentes, a IA, em sua essência atual para tarefas complexas de interpretação, ainda opera primariamente replicando e organizando informações do passado. Ela não tem capacidade de compreender o significado social, humano ou as nuances jurídicas por trás desses dados.

Enfim, ela processa os dados mas não interpreta em profundidade!

Quais as Barreiras da IA na Advocacia?

  1. Falta de Julgamento Crítico e Contextual:

A aplicação do Direito exige mais que lógica pura; demanda interpretação dentro de contextos humanos, sociais e culturais. O Código de Processo Civil (art. 489, §1º) determina que decisões judiciais sejam fundamentadas considerando o caso concreto e os argumentos das partes – uma tarefa que exige discernimento e análise crítica que vão além da capacidade da IA.

  1. Insegurança Jurídica e Responsabilidade:

Quem responde se um sistema de IA cometer um erro com consequências legais? O desenvolvedor? O usuário? O cliente? A legislação atual, como o Marco Civil da Internet, não cobre especificamente decisões jurídicas automatizadas, gerando um vácuo regulatório. A Resolução nº 332/2020 do CNJ já estabelece um limite claro: a IA deve servir como ferramenta de apoio, sem substituir a decisão humana final. A questão da responsabilidade permanece em aberto.

  1. Criatividade e Estratégia Jurídica:

A advocacia de alto nível é estratégica. Advogados desenvolvem teses, adaptam abordagens, reagem sob pressão e constroem soluções sob medida. A IA não possui capacidade de improviso ou pensamento original – lembrando: ela se limita a reproduzir padrões existentes.

  1. Ética e a Relação de Confiança:

O Código de Ética da OAB (art. 2º) é taxativo sobre o dever do advogado de agir com zelo e preservar a confiança do cliente. Essa relação é a base da advocacia. Uma máquina, por mais eficiente que seja, não estabelece vínculo de confiança, não oferece a segurança ou a compreensão que um cliente busca ao expor uma situação complexa. A dimensão ética e relacional é insubstituível.

Conclusão Prática:

Voltando à questão inicial: os advogados serão substituídos pela IA? A resposta direta é NÃO. A Inteligência Artificial é, sem dúvida, uma ferramenta poderosa, capaz de otimizar tarefas, reduzir custos e agilizar o acesso à informação. Seu valor como suporte é inegável.

No entanto, a ideia de substituição total ignora as limitações técnicas da IA e a própria natureza do Direito, que é intrinsecamente ligada a fatores humanos, sociais e éticos.

Enquanto a prática jurídica exigir pensamento crítico, estratégia, responsabilidade e a capacidade de construir relações de confiança, o papel do advogado permanecerá central e, porque não dizer, insubstituível.

A IA entra como um recurso no arsenal do advogado, mas a tomada de decisão final e a condução estratégica continuam, por ora, sendo território humano.

Em verdade, a IA não é o algoz do advogado, como muitos tem, enganosamente, propagado, mas uma poderosa aliada. O desafio para os profissionais do Direito é claro: não se trata de temer o avanço, mas de dominar essas novas ferramentas, integrando-as para elevar a prática jurídica e reafirmar, com ainda mais convicção, o valor insuperável do julgamento humano na busca pela Justiça.


[1] Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=507120&ori=1> Acesso em: 15/04/2025, às 17:31.

Escrito por:

André Luis Quatrini Junior
Advogado – Integrante do Setor Cível

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