REPRESENTANTE COMERCIAL NÃO PODE COBRAR DE FORMA RETROATIVA  VALORES DEDUZIDOS DE TRIBUTOS E FRETE DO CÁLCULO DA COMISSÃO APÓS ANOS DE DESCONTO

Não há dúvidas que o Art. 32, § 4º, da Lei nº 4.886/65 (com as alterações da Lei nº 8.420/92) determina que o representante comercial terá direito ao recebimento de suas comissões calculadas sobre o valor total das mercadorias (“valor total da nota fiscal”), isto é, sem deduções de tributos, fretes, ou qualquer outro valor que não corresponda diretamente ao valor da mercadoria.

Contudo, nos parece contraditório e injusto que, após anos de vigência do contrato de representação comercial, em que o representante concordou com os descontos de tributos e fretes do cálculo do valor de sua comissão, SEM NUNCA RECLAMAR, este ingresse com ação judicial e invoque a lei para obrigar a empresa representada a lhe pagar toda a diferença descontada.

Foi exatamente neste sentido que a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, de forma unânime, no julgamento do RECURSO ESPECIAL nº 1838752 SC, afastou a pretensão de representante comercial que, de forma contraditória, exigia retroativamente valores a título de diferenças que sempre foram descontadas.

Afirmou a Relatora, Ministra Nancy Andrighi, que “[…] ao longo de toda a relação negocial em que se implementaram as reduções das comissões de forma unilateral pela recorrida (representada), em nenhum momento houve insurgência por parte da recorrente (representante), que somente propugnou pelas diferenças das comissões após a rescisão unilateral do contrato pela recorrida. Ou seja, apesar das diminuições das comissões, a recorrente permaneceu no exercício da representação comercial por quase 22 (vinte e dois) anos, despertando na recorrida a justa expectativa de que não haveria exigência posterior” (grifo nosso).

Concluindo, esclareceu, ainda a Julgadora, que “o princípio da boa-fé objetiva torna inviável a pretensão da recorrente de exigir retroativamente valores a título de diferenças, que sempre foram dispensadas” (grifo nosso).

Este entendimento do Superior Tribunal de Justiça foi embasado no instituto jurídico da supressio, que nada mais é do que a “perda do direito como consequência de uma inatividade do titular, quando essa inatividade, tendo perdurado por um período de tempo […] apresenta-se, em face de circunstâncias idôneas a determinar, na contraparte, um investimento de confiança merecedor de proteção com base no princípio da boa-fé” (MARTINS-COSTA, Judith. A Boa-fé no Direito Privado. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 710).

Em termos simples, se o representante comercial concordou com o desconto de tributos e fretes do cálculo do pagamento de suas comissões E/OU deixou de se manifestar contrário a estes descontos durante anos de contrato, NÃO TEM O DIREITO de cobrá-los judicialmente após a rescisão do contrato. 

Não se pode deixar de creditar, por fim, que essa decisão, com a aplicação do instituto da supressio aos contratos de representação comercial, é um grande avanço, no sentido de trazer estabilidade e justiça à relação contratual, coibindo comportamentos contraditórios de representantes que, após o término/rescisão do contrato, não raras vezes, surpreendem as empresas representadas com demandas de alto valor econômico, para cobrar valores que NUNCA foram acordados entre as partes.

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